domingo, 3 de outubro de 2010

De volta aos velhos princípios fundamentais
Nesta época menos exuberante, os administradores precisam lembrar-se de antigas virtudes, e praticá-las todos os dias.

Se é verdade que o mau tempo produz bons líderes, os EUA podem esperar por uma legião deles. A recessão iniciada em março do ano passado e os ataques terroristas de 11 de setembro fizeram de 2001 um ano inesquecível, de triste memória. Em tempos assim, a reação das pessoas é estranha. Algumas ficam paralisadas pela indecisão; outras agem com uma precipitação desnecessária. Numa grande empresa, um comportamento desse tipo, multiplicado muitas vezes, pode ser desastroso. Em épocas de crise, ter as pessoas certas nos lugares certos é vital. Nas épocas de prosperidade há uma camada extra de gordura que basta para absorver algumas decisões erradas, mas, em tempos de recessão, uma boa administração é questão de sobrevivência.
Dave Young, chefe da filial de Boston do Boston Consulting Group, afirma que para muitas empresas a atual retração acabará se revelando uma bênção. "Significa que o valor de uma empresa nos mercados de capitais não vai mais ser consequência da 'exuberância irracional' ou da propaganda exagerada, mas, sim, da boa administração."
O que é uma boa administração? Com certeza não é algo que surge a partir do nada. As empresas hoje bem administradas já tinham boa gestão e a achavam útil na prosperidade. A diferença é que, no clima mais difícil, a boa gerência torna-se essencial.
O núcleo da boa administração é um conjunto de três virtudes cultivadas em outros tempos - e esquecidas durante os anos da bolha, quando parecia que a norma era o vale-tudo. No mínimo, bons administradores precisam distinguir-se por estas três qualidades:
_ ser honesto;
_ ser frugal;
_ estar preparado.
Para muitos executivos, isso pode ser tão empolgante como fazer compras numa loja Wal-Mart quando se está acostumado à Bloomingdale's. No fundo, porém, eles sabem onde encontrarão o valor maior.
Virtudes essenciais.
Ser honesto, naturalmente, não é apenas questão de manter-se dentro dos limites da lei. A maioria dos executivos obedece à lei, e é por isso que os poucos que a infringem ganham tanta atenção. Mas, para a maioria, que respeita a lei, o problema é escapar da auto-ilusão, e isso requer sistemas em que as recompensas não estão relacionadas a números que podem ser manipulados e exagerados à vontade.
Acima de tudo, trata-se de ser honesto naquilo que se refere ao valor real da empresa e do seu potencial. Warren Buffett, chairman da Berkshire Hathaway e um dos mais famosos "criadores de valor" na cena empresarial americana dos últimos vinte anos, escreveu numa de suas célebres cartas anuais aos acionistas: "Não queremos maximizar o preço das ações da Berkshire (...) Desejamos que sejam negociadas dentro de uma faixa estreita, centrada no seu valor intrínseco." Os executivos devem pensar no que é o "valor comercial intrínseco" de sua empresa. E devem fazer o mesmo os investidores, analistas, consultores de mercado e todos os que frequentam o carrossel das celebrações empresariais.
Da mesma forma, ser frugal não é apenas questão de reduzir os custos numa fase de retração. É questão de ser econômico com seus recursos em todas as épocas, de estar continuamente em busca de novas maneiras de cortar despesas e criar uma atmosfera na qual o desperdício e o excesso sejam inaceitáveis, sejam quais forem as condições do mercado. A Wal-Mart é uma empresa que leva isso ao extremo - por exemplo, seus executivos compartilham o quarto de hotel nas viagens de negócio e espera-se que tragam canetas de brinde dos congressos a que comparecem. Esse exagero pode ser contraproducente, a ponto de afastar os administradores mais capazes. Mas o sucesso duradouro de muitas empresas - desde Andrew Carnegie e J.P. Morgan nos anos 1900 até Warren Buffett e Sam Walton nos dias de hoje - foi construído com base numa frugalidade que beira o pão- durismo.
Para os que foram educados nesses moldes tradicionais, a louca extravagância com que muitas pontocom implementaram seus planos de negócios no fim dos anos 90 já prenunciava uma fatalidade desde o primeiro dia. Veja-se o caso da boom.com, loja virtual de roupas. Antes de ter vendido uma única peça, os fundadores já haviam gasto fortunas num pequeno exército de guarda-costas Gurkha [grupo étnico do Nepal, conhecido por constituir um tradicional regimento do exército britânico], rios de champanhe e fileiras de assentos no Concorde para fazer reuniões com seus banqueiros. Quanto à Webvan, a falida loja on-line de alimentos, frotas inteiras de seus veículos, muitos dos quais mal fizeram uma única viagem de entrega, hoje estão à venda, imóveis nos estacionamentos. São testemunhas silenciosas do desperdício de mais de US$ 1 bilhão. Numa economia em que o lucro não é mais a medida do sucesso comercial, pode ser difícil encontrar motivos para controlar custos.
Por último, os administradores precisam voltar à idéia de que vale a pena planejar para o futuro. "A sorte só favorece as mentes preparadas", diz Louis Pasteur, cientista francês do século 19. Na recessão americana anterior, no início dos anos 90, o entusiasmo pelo downsizing eliminou camadas inteiras na hierarquia administrativa e atingiu em especial os departamentos de planejamento. Muitos tornaram-se alvo fácil para os cortes, por se concentrarem demais nas minúcias financeiras de planos futuros que poderiam ou não ser implementados, em vez de considerar a situação da empresa como um todo.
O planejamento sofreu abalo ainda maior por causa dos mitos que se criaram em torno da chamada "nova economia". Seus defensores pareciam fazer pouco do planejamento, afirmando que as empresas precisavam pensar de maneira diferente, não apenas sobre o dia de hoje, mas também sobre o amanhã. Num mundo em que as mudanças aconteciam, pelo que se dizia, com a velocidade da luz e em que até mesmo a poderosa Microsoft poderia ver a chegada surpreendente de uma nova concorrente que lhe tomaria mercados, tentar enxergar mais à frente da próxima injeção de capital parecia não fazer sentido. Por que se preparar, diziam, já que ninguém sabia para o quê era preciso preparar-se?
Hoje, muitas empresas - inclusive, grandes nomes, como Nokia, Hewlett-Packard e EDS - estão novamente levando a sério o planejamento estratégico. Algumas nunca o abandonaram. Na Emerson, notável empresa de engenharia do Meio Oeste americano, o planejamento sempre foi uma alta prioridade. Seu executivo principal passa 60% do tempo em reuniões com os chefes de divisão, para discutir e questionar seus planos. Seja nos anos bons, seja nos maus, a empresa está preparada para a maioria das eventualidades.

The Economist
Fonte:
The Economist
http://www.valoronline.com.br/valoreconomico/materia.asp?id=1110950&ed_ref=303

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